
O Brasil prepara um arsenal de medidas contra as tarifas dos EUA, com destaque para a possível suspensão de patentes e royalties. Entenda a Lei de Reciprocidade Econômica, sancionada em abril, e o impacto dessa cartada audaciosa nas relações bilaterais e na economia global.
A escalada de tensões comerciais entre Brasil e Estados Unidos tem levado o governo brasileiro a mapear e considerar um conjunto de medidas retaliatórias que podem redefinir a dinâmica das relações bilaterais. Em pauta, um “arsenal” de contramedidas que vai além das tradicionais sobretaxas de importação, mirando diretamente em direitos de propriedade intelectual.
O Contexto da Disputa e a Busca por Medidas Eficazes
A decisão de formular um plano de retaliação surge em resposta às tarifas recíprocas anunciadas por Donald Trump, um movimento que ligou o sinal de alerta em Brasília. Inicialmente, o Brasil foi tarifado com a alíquota mínima de 10%, mas a apreensão com uma possível intensificação das medidas protecionistas americanas impulsionou o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) a elaborar um inventário de ações.
Estudos internos do MDIC revelaram que a aplicação de sobretaxas genéricas sobre produtos americanos importados pelo Brasil poderia se converter em um “tiro no pé” para a indústria nacional. Grande parte da pauta de importações dos EUA é composta por bens intermediários, essenciais para o processo produtivo das empresas brasileiras. Aumentar as tarifas sobre esses insumos encareceria a produção doméstica, tornando-a menos competitiva. Além disso, a imposição de sobretaxas em bens de consumo finais de origem americana teria impacto limitado, dado o baixo volume de compras brasileiras nesse segmento.
A Cartada da Propriedade Intelectual
Diante desse cenário, a suspensão de direitos de propriedade intelectual emerge como uma das alternativas mais eficazes e estratégicas. Esta medida envolveria:
- Patentes de medicamentos: Permitindo a produção de genéricos e impactando significativamente o lucrativo setor farmacêutico americano.
- Patentes de sementes agrícolas: Afetando empresas de biotecnologia agrícola com forte atuação no mercado brasileiro.
- Royalties audiovisuais: Repensando a remuneração por conteúdos cinematográficos e musicais.
Setores como o farmacêutico e o de sementes agrícolas representam mercados substanciais para companhias dos Estados Unidos no Brasil, o que tornaria essa ação um “golpe financeiro” direto, capaz de gerar a pressão desejada sobre a Casa Branca.
Amparo Legal: A Lei de Reciprocidade Econômica (Lei nº 15.122/2025)
Essa estratégia audaciosa encontra amparo na Lei nº 15.122, de 11 de abril de 2025, conhecida como a Lei de Reciprocidade Econômica. Sancionada em abril e publicada em 14 de abril de 2025 no Diário Oficial da União, essa legislação autoriza o Poder Executivo a suspender concessões comerciais, de investimentos e, notavelmente, obrigações relativas a direitos de propriedade intelectual.
A Lei nº 15.122/2025 é acionada quando um país ou bloco econômico adota ações que:
- Interfiram nas escolhas soberanas do Brasil por meio de ameaças ou aplicação unilateral de medidas comerciais, financeiras ou de investimentos.
- Violem acordos comerciais, negando ou prejudicando benefícios ao Brasil.
- Constituam medidas unilaterais baseadas em requisitos ambientais mais onerosos do que os padrões brasileiros, considerando, inclusive, o Acordo de Paris e as particularidades da matriz energética nacional.
É fundamental destacar que a suspensão de direitos de propriedade intelectual, embora prevista, é considerada uma medida de caráter excepcional, a ser utilizada apenas quando outras contramedidas se mostrarem inadequadas. A lei exige que as ações sejam proporcionais ao impacto econômico sofrido e busquem minimizar danos à atividade econômica brasileira.
Próximos Passos e Perspectivas
Apesar de o “arsenal” de retaliações estar mapeado e a lei já estar em vigor, o governo brasileiro ressalta que nenhuma decisão final foi tomada. As discussões atuais focam principalmente em uma “resposta política” à postura americana, com a diplomacia ainda buscando mitigar os efeitos das tarifas.
A adoção de medidas retaliatórias, especialmente no campo da propriedade intelectual, sinalizaria uma mudança significativa na postura do Brasil no cenário internacional, demonstrando a disposição de usar todos os instrumentos legais disponíveis para defender seus interesses comerciais e a soberania nacional. O desdobramento dessa questão será crucial para o futuro das relações Brasil-EUA e para o comércio global.
Para saber mais sobre a Lei nº 15.122/2025 e suas implicações, acesse a íntegra da legislação no Diário Oficial da União.https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2025/Lei/L15122.htm